Se você achou que esse gênio inglês
já tinha dado tudo de si, o novo álbum de Johnny Marr veio para refutar esta
teoria, trazendo um dos melhores trabalhos da carreira solo do guitarrista. Apresentando
uma mistura incrível de antigas e novas sonoridades, Call The Comet prova que
ainda há muito a ser descoberto no rock britânico.
Dando sequência aos ótimos The Messenger (2013) e Playland (2014), Call The Comet é um dos trabalhos
mais inspiradores com os quais Johnny Marr já nos presenteou desde a época dos
Smiths, com algumas faixas claramente feitas para agradar os fãs. Assim como os
anteriores, o novo álbum não tenta inventar muito e se mantém quase sempre no seguro,
mas ainda traz algumas experimentações aqui e ali.
Um dos pontos que mais marcaram a
sonoridade do álbum é o fato de que Marr usou e abusou dos efeitos nos vocais, no
entanto, nem podemos culpa-lo, o homem é um guitarrista incrível, mas não está
nem perto de ser um excelente vocalista, o que não necessariamente afeta a qualidade
do trabalho feito por ele, que tem inclusive melhorado nesse quesito.
Sem se apegar muito às suas
raízes melancólicas, Marr apostou um pouco mais em canções mais straightforward, como a faixa de abertura
“Rise”, que traz vocais limpos em
cima de uma base simples e cadenciada, destacando a guitarra distorcida. O
single “The Tracers” acelera o ritmo
e apresenta um estilo mais atmosférico, usando do reverb e do baixo para criar algo muito mais próximo do pós-punk do
que do indie rock como de costume. Os vocais de apoio também somam pontos
favoráveis à faixa.
“Hey Angel” exemplifica muito bem o que foi dito sobre os efeitos
nos vocais, mas não é de todo ruim, o uso não chega a ser exagerado e não
incomoda, apenas acrescenta. O solo de guitarra antes do último refrão deu um
toque especial à faixa, quebrando o clima morno que acompanha a maior parte da
canção.
Pra você que achou que não iriam
ter faixas que lembram Smiths, temos “Hi
Hello”, que tem tanta semelhança com a antiga banda do guitarrista, que
quase é possível imaginar a canção na voz de Morrissey. Comparações à parte, a faixa
é uma das melhores do disco e apresenta um clima soft romântico que não havia
sido muito explorado nos álbuns anteriores. Não é surpresa que tenha sido
escolhida como segundo single.
Infelizmente nem tudo são flores.
O experimentalismo de ”New Dominions”
deu vida a uma canção repetitiva, cansativa e talvez até um pouco pretensiosa.
A base da faixa é um loop de batida eletrônica, com um leve flanger de fundo que deixa tudo ainda
mais chato. Os elementos que supostamente seriam os principais, acabaram ficando
ofuscados pela péssima base e o que nos sobrou fio uma faixa seca e com um
gostinho de demo com overdubs. Sim, meus
amigos, Marr também erra.
Voltando à programação normal, “Day In Day Out” traz a sonoridade
característica de Johnny Marr, levada de tempo médio, um violão otimista em
segundo plano, vocais limpos e um refrão viciante, além de um ótimo solo de
guitarra como cereja do bolo. Me perdoem a comparação, mas chega a ser impossível
não lembrar do clássico “Hand In Glove” dos Smiths, o que, ao meu ver, é sim um
ponto positivo.
O terceiro single “Walk Into The Sea” chama a melancolia
de volta e, com um simples riff de
guitarra, consegue dar vida a uma das canções mais bonitas da carreira de Marr,
que prova saber muito bem o que está fazendo, apostando novamente em tempo
médio e teclados sutis, overdubs de
guitarra precisamente bem colocados, além do piano que aparece pouco, mas dá
todo um clima diferentão à atmosfera da faixa. Sem dúvidas um grande destaque
do álbum.
Com influências de funk e até
lampejos de disco, a dançante “Bug”
renova os ânimos e vem bem digna de single, com um baixo envolvente e
sintetizadores bem típicos da década de oitenta, além é claro de um refrão pra
lá de viciante. Para o nosso azar, a decepção vem em seguida, com a esquisita “Actor Attractor”. Numa primeira
ouvida, a faixa até parece promissora, mas no final das contas, a gente espera
durante cinco minutos e meio e nada acontece. É melhor fingir que nunca nem
viu, né, gente?
A maravilhosa “Spiral Cities” acaba por compensar a
última faixa e nos conquista logo nas notas iniciais. É seguro dizer que esta é
uma das melhores composições de Marr, pois cada elemento é grandioso por si só, a
bateria, o baixo, os vocais e obviamente as guitarras, tudo é um grande
destaque. Não me surpreenderia se fosse escolhida como último single.
“My Eternal” é uma viagem só de ida ao final da década de setenta,
com guitarras típicas do pós-punk, levada rápida, sintetizadores pra todos os
lados e efeitos nos vocais. Não há muito o que destacar, mas é bom avisar que a
nostalgia pode te enganar. A faixa que encerra o disco é a emocionante “A Different Gun”, suave e melancólica
na medida certa, com um ritmo arrastado e contagiante, além de conter a melhor
performance vocal de Marr no álbum. Sem dúvidas a melhor canção para encerrar
um dos melhores álbuns do ano.
É difícil de acreditar, mas
depois de quase quarenta anos de carreira, Johnny Marr continua lançando seus
melhores álbuns. O guitarrista provou mais uma vez que ainda tem muita lenha
pra queimar e muitas composições incríveis a serem mostradas. “Call The Comet” reúne ótimas canções e
se posiciona facilmente entre os melhores álbuns do ano. Com o perdão do
trocadilho: big Marr strikes again!
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