Como sempre sendo geniais ao mixar conceitos bem trabalhados com incríveis canções pop, Years & Years retorna com seu segundo álbum, o impecável Palo Santo. E como já era de se esperar, a banda não decepcionou nem um pouco!
Superar o debute Communion parecia uma tarefa impossível, uma vez que a estreia da banda foi marcante e bem polida. Para se dar bem no novo trabalho, o grupo aprimora um conceito fixo que deriva do nome que assinou o disco: "palo santo" é uma espécie de madeira, que ao ser queimada, libera uma fumaça considerada espiritual e curativa muito utilizada na América do Sul. Há uma constante transição entre o sagrado e o profano no álbum, trazido aqui de forma enriquecedora com letras inteligentes e melodias cativantes.
Iniciamos com o já conhecido single "Sanctify", que é quase uma síntese do conceito do álbum. Aqui, Olly canta sobre não existir barreiras ou preconceitos desde que ele consiga ser santificado pelos pecados cometidos. Ênfase no ousado e genial verso com trocadilhos “Você não precisa ser hétero/direto comigo / Eu vejo por baixo da sua máscara/masculinidade”. Não há motivos para medos ou vergonha: o importante é ser santificado. A faixa é o single mais experimental do grupo, soando diferente do restante do álbum, porém se mantendo fiel ao conjunto da obra. Pela ousadia, o preço foi uma recepção fria do público, com a canção sequer atingindo o Top 20 do Reino Unido - o que não é mais um problema com o segundo single, mas falaremos dele mais a frente.
O álbum assume uma faceta bem mais pop a partir da segunda faixa, a inspiradora “Hallelujah”. Composta por alguns nomes bem conhecidos do público, entre eles Julia Michaels e Justin Tranter, ainda teve produção do icônico Greg Kurstin, responsável por trabalhos de Adele, Sia e Kendrick Lamar. A canção eleva o ritmo e pinta o clima do trabalho, sendo uma ótima candidata a single. É viciante, inteligente, comercial sem soar óbvia e com letras otimamente pontuadas.
Continuamos acelerados em “All For You”, outra produção de Kurstin. Ainda é dançante, mas não se parece com a anterior ou a próxima. Talvez um grande triunfo do grupo seja conseguir criar sonoridades com propostas parecidas, mas que não soam iguais. Years & Years é uma das poucas bandas pop da atualidade que conseguiram alcançar uma identidade sonora tão consolidada. Nessa canção, os vocais estão no ponto e é impossível ficar parado; soa como se a sonoridade do debute tivesse ficado mais elegante e bem produzida, o que não deixa de ser verdade. “Karma” fecha o trio inicial do corredor dançante e soa refrescantemente agitada, trazendo um encerramento incrivelmente enriquecido.
Chegamos em “Hypnotised” e “Rendezvous”, ambas produções de Mark Ralph - outro gênio. A primeira diminui a velocidade do álbum e é como um respiro no projeto, mas é extremamente empolgante, uma vez que traz um novo gás para a continuidade do trabalho. O mesmo pode ser dito da segunda citada, que acelera de novo o ritmo das coisas e funciona como uma divertida e bem composta canção up-tempo.
A seguir somos introduzidos a “If You`re Over Me”, talvez o único ponto que enfraquece um pouco o conjunto da obra e não conversa tanto com o resto do disco. A produção de Steve Mac foi, claramente, um adendo de última hora depois da fria recepção de “Sanctify”. E funcionou, pois a canção pegou um Top10 e surpreendeu com o desempenho inesperado. É um hit e é uma ótima canção, mas não adiciona nada impressionante à história contada até aqui.
“Preacher” é mais uma composição assinada por Michaels e Tranter, e traz de volta o conceito de sexo, pecado e religião abordados desde o início. As letras nunca soaram tão inteligentes: são feitos inúmeros trocadilhos entre a sexualidade e o famoso armário, com Olly clamando que seu amante se assuma, pois ele quer amá-lo. Saber que ele é, além de frontman e vocalista da banda, também é o compositor principal de todas as canções do álbum. Isso traz uma singularidade e honestidade únicos, fazendo tudo soar mais real e mais próximo de Olly.
Essa realidade é vista em “Lucky Escape”, uma excelente canção sobre ter a sorte de escapar de um relacionamento ruim. Não chega a ser lenta, mas também não é agitada; simplesmente cativante e curiosa, causando um contínuo desejo de ouvir o trabalho.
Se “Sanctify” era uma espécie de síntese do que o conceito propõe, “Palo Santo” é a definição completa. Aqui, Olly brinca sobre queimar-se com fogo; seja este o fogo sexual, seja este o fogo que acende o palo santo. Uma vez visto o mini-filme e ouvindo logo depois o álbum, fica clara a proposta que envolve todo o mistério do polêmico entre o sexo e a religião. Se o álbum acabasse aqui, já teríamos um resultado extremamente positivo. Mas há uma última coisa a ser falada ao fim na faixa que encerra o disco, "Here", a única produzida pela própria banda. A música é curta, mas serve como um epílogo pós-temáticas polêmicas e encerra o álbum com maestria.
Mas isso depende de qual versão do álbum você está ouvindo; se sentir-se cativado pelo que ouviu até agora, eles entregam 3 canções bônus que soam como algumas palavras que não foram ditas para que o conceito não se perdesse, mas soam tão geniais quanto o restante. “Howl” é uma confissão, tendo uma sonoridade curiosa e inteligente para uma canção pop. “Don´t Panic” é, facilmente, Top3 do álbum. A letra é uma das mais incríveis da banda e fala sobre a sensação de quase surtar e a esperança de não entrar em pânico. Os vocais de Olly estão impecáveis e o cantor brinca com registros mais altos ao longo da canção.
Já em “Up In Flames”, última canção deste universo, ganhamos de presente mais uma produção de Kurstin. Se tivemos diversas sínteses e definições ao longo do projeto, aqui atingimos o auge da brincadeira com a sexualidade. Olly canta sobre um homem, supostamente hétero, que está discutindo com sua namorada após descobrir sobre os dois. A sonoridade é elegante e os vocais podem ser sentidos com uma forte verdade sobre sua vida.
Palo Santo é, portanto, o melhor trabalho da banda. Sim, ele conseguiu superar o álbum de estreia. Por mais que Communion seja um momento genial, aqui temos um conceito executado com maestria e que é falado em absolutamente todas as canções, mesmo que de forma discreta. Apesar de pop e dançante, é mais difícil de digerir do que o primeiro álbum por ser menos comercial, mas isso não é um defeito. Pelo contrário: cada vez que o álbum toca, você se pega cada vez mais imerso no universo de Palo Santo e toda sua temática religiosa, sexual, ambígua e obscura. Se superar a estreia era difícil como citado no início da resenha, a banda ganha todos os créditos por trazer um trabalho completamente inovador e refrescante.
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