Grande aposta da nova MPB, Vitor Guima lança versão acústica de "Por Aí" e reflete sobre o disco "O Estrangeiro" em entrevista exclusiva

Após o lançamento do seu elogiado álbum de estreia O Estrangeiro, Vítor Guima apresentará o trabalho em São Paulo, no dia 30 de novembro. Para comemorar a ocasião, o músico acaba de lançar com o Keeping Track uma versão acústica da faixa “Por Aí”. Aproveitamos o momento também para bater um papo com Vítor sobre o lançamento, seu processo criativo e o tão aguardado show.

A nova versão intimista de  “Por Aí” sucede o sucesso dos registros voz e violão de “Laís” e “Tortos Assim”. O clipe faz parte da sessão acústica do O Estrangeiro gravada no Studio Grama, em Araras, no interior do Estado de São Paulo.


"Nunca me esqueço de Mrs. Dalloway (personagem do livro homônimo de Virginia Woolf) que estava sempre dando festas para encobrir o silêncio. ‘Por Aí’ tem um tanto desse pensamento em seu cerne”, revela o artista, que tem diversas referências literárias em sua criação musical. “Dessa solidão de avenidas lotadas em que só os faróis te encaram e você se sente alheio a um mundo no qual você parece não se encaixar, em que todas as pessoas parecem felizes e acompanhadas e parecemos não nos entender nem com nossos ‘tais’, daquele silêncio todo por baixo do agito das festas nas quais acabamos nos sentindo ainda mais solitários mesmo cercados de pessoas. É um trabalho muito grande passar a não ter medo do silêncio.”

A canção estará no setlist do show do dia 30 de novembro, que acontecerá no Breve (R. Clélia, 470). Os ingressos antecipados para apresentação custam R$15 e já podem ser adquiridos pelo site Sympla

Já vai se preparando para o show e confira a seguir a entrevista que fizemos com o Vítor Guima:

KT: Para nos contextualizarmos a partir dos primeiros passos, em que momento você decidiu exteriorizar suas ideias em um primeiro álbum de estúdio? 

VÍTOR: Na adolescência eu tive bandas cover e acho que foi um processo natural querer começar a escrever as próprias canções. Com o tempo, uma faixa começou a conversar com outra e acabei encontrando essa unidade e escrevendo novas canções que coubessem ali.

KT: Você é conectado com várias outras formas de arte, incluindo cinema, literatura e filosofia. De que forma elas agregaram para a construção de O Estrangeiro

VÍTOR: Essas outras artes são absolutamente intrínsecas a O Estrangeiro. A filosofia, a literatura, o cinema, são tão importantes quanto a música nesse disco. Albert Camus é tão influente quanto Joni Mitchell. Pedro Almodóvar tão influente quanto Belchior. Baudelaire tão influente quanto Bob Dylan. Fernando Pessoa tão influente quanto Cartola. Para mim essas conexões estão no cerne da obra, não à toa, por exemplo, o título vem de um romance de Camus, uma canção é um diálogo com Álvaro de Campos e a última faixa do álbum leva o nome de um filme de Almodóvar.

KT: E musicalmente falando, quais foram suas maiores inspirações e desafios para compor a obra? 

VÍTOR: O maior desafio foi encontrar canções que mostrassem esse clima de unidade. Algumas ficaram de fora, outras foram compostas especificamente com o conceito do disco em mente. Acho que a maior inspiração foi conseguir chegar junto desse estrangeiro no final dessa jornada. Ao contrário do que algumas pessoas me dizem ou perguntam, esse não é um álbum absolutamente autobiográfico apesar de eu ter inúmeras relações com essas buscas e questionamentos apresentados no disco. Mas a conclusão tanto para mim quanto para essa "personagem", vamos colocar assim, é de que essa busca (seja ela qual for) seguirá fazendo parte de sua existência.

KT: De que maneira você acredita que esse conjunto de faixas costura a ideia de ser um “estrangeiro” hoje em dia? 

VÍTOR: Essa filosofia na qual o disco está baseado coloca o humano em uma existência absolutamente solitária, uma existência que não tem um sentido específico ou predestinado. Fomos apenas jogados aqui e precisamos dar sentido a tudo isso. A tanta dor, a tantas coisas tão belas, a coisas ruins e duradouras e coisas fantásticas e efêmeras. É essa a busca dentro desse disco, é essa a busca que vejo na minha geração. Ao meu ver é essencial que continuemos buscando. No final do disco não existe uma resposta, existe uma constatação de que essa busca continua.

KT: Tem alguma faixa favorita no momento?

VÍTOR: "Tortos Assim" sempre foi minha faixa favorita do álbum. Quando esse estrangeiro entra no trem, entende que coisas tão belas não são perfeitas, que a possível fragilidade das coisas faz parte do processo. É um momento de conformidade consciente, e logo em seguida a busca continua.



KT: Logo em sua estreia, você foi apontado como nova aposta da MPB por vários veículos de imprensa. Como você se sente sobre isso?

VÍTOR: Isso foi realmente uma alegria muito grande, ver pessoas dizendo que vão ficar de olho no meu trabalho, que sou um nome a ser acompanhado e, como vocês aqui do Keeping Track disseram, que sou uma "grande aposta da nova MPB". Eu fiquei muito honrado com isso, de verdade. Obrigado! É um tempo tão interessante esse em que podemos gravar algo em uma cidade do interior de São Paulo e chegar tão longe. Outro dia até postei no Instagram que no top 10 cidades que mais estavam ouvindo meu trabalho no Spotify naqueles últimos dias, apenas 3 eram brasileiras. Ouvintes em Santiago, Lisboa, Bogotá, Cidade do México. É realmente fascinante.

KT: Aproveitando o pós lançamento do disco, você fará o seu show de estreia de em São Paulo no próximo dia 30 de novembro, no Breve. O que podemos esperar dessa noite e como será o repertório? 

VÍTOR: Estou muito ansioso por essa noite, porque vai ser minha primeira vez tocando em Sampa. No repertório teremos O Estrangeiro na íntegra em formato voz e violão e algumas canções que influenciaram o disco. Eu me alterno entre violões de aço, nylon, 12 cordas e algumas gaitas. Sempre fui fascinado por esses cantores folk que são (ou conseguem ser) uma banda de uma pessoa só. Bert Jansch, Joni Mitchell, Nick Drake, Davy Graham, Karen Dalton, The Tallest Man on Earth e por aí vai... Convido todos os leitores do Keeping Track a aparecer por lá! Vai ser uma noite incrível! A abertura do show fica a cargo do Carandina, um sambista muito massa que está prestes a lançar seu segundo trabalho.

PARA CONHECER MAIS SOBRE VÍTOR GUIMA

Um álbum: É difícil falar de um só mas sejamos mais instantâneos: Clics Modernos (1983) do Charly García. Ouvi hoje pela manhã. Por sinal, segue o jabá: Me segue lá no Instagram @ovitorguima que eu posto recomendações de disco quase toda manhã!

Um show memorável: Concert for George (2002), lembro quando comprei esse DVD e ele virou minha cabeça para sempre.

Um filme: Sem Essa, Aranha (1970), dirigido pelo Rogério Sganzerla.

Um sonho: Ter uma música minha gravada pelo Ney Matogrosso e conseguir dormir um pouco mais para ter mais tempo para sonhar.

Um fato curioso: Eu nunca uso shorts ou bermudas para sair de casa e uso botas em toda e qualquer ocasião.

Uma frase para a vida: Para a vida pode ser um tempo muito longo, mas teve uma frase sartreana que me voltou a mente depois de uma conversa que tive há pouco tempo. Eu não me lembro ao certo se ele coloca na primeira ou terceira pessoa, mas creio que independente disso o sentido não se altere significativamente. "Não importa o que fizeram de mim, o que importa é o que eu faço com o que fizeram de mim". Ando com ela na cabeça nesses últimos dias...