Atriz, diretora, compositora e cantora, Juliana Linhares é vocalista da banda Pietá e do projeto Ira Ira e, agora, lança seu primeiro disco solo: Nordeste Ficção. Nascida em Natal, no Rio Grande do Norte, Juliana foi para o Rio de Janeiro em 2010. Essa mudança proporcionou a ela uma observação privilegiada a respeito dos estereótipos que o resto do Brasil impõe no Nordeste. Buscando um espaço para falar sobre isso, nasceu o Nordeste Ficção.
A artista lançou seu primeiro EP, Perdendo o Juízo, em dezembro do ano passado e agora está lançando o álbum de estreia. Sobre o momento escolhido para compartilhar seus projetos solo, Juliana diz: "Eu não escolhi, acho que tava tão urgente dentro de mim... Eu não escolhi mesmo! Acho que foram alguns fatores. O primeiro fator era 'ou eu faço isso, ou eu vou deprimir nessa pandemia'. Eu fico pensando, pô, depois de anos pra lançar um disco, eu lanço logo quando não pode fazer show. É horrível, mas ao mesmo tempo, eu acho que se eu não tivesse feito isso por mim nesses tempos, eu ia tá muito mal".
Três anos atrás, quando ficou completamente sem voz por uma semana, Juliana teve a necessidade de se entender individualmente. Foi então que passou a imaginar sua carreira solo. "Tenho uma banda chamada Pietá, já lancei dois discos com eles e um disco com outro grupo chamado Ira Ira. Dentro desses trabalhos, eu só tive uma música que era minha. Eu já tava com uma necessidade grande de fazer uma coisa minha, porque é muito legal banda e grupo, mas as vezes você passa por cima de coisas que são suas e dá vontade de você poder colocar muito de você ali e eu tava com muita coisa pra dar".
É muito importante um álbum ter todo o significado que Nordeste Ficção tem sobre o Nordeste, e a ideia de tratar sobre esse assunto no disco, surgiu a partir de outras obras artísticas. "Eu tive acesso a um livro chamado A Invenção do Nordeste e Outras Artes, e a um espetáculo sobre o livro do grupo Carmin, que é de Natal. O grupo ganhou como melhor espetáculo concorrendo com grandes espetáculos do Rio de Janeiro. Eu tava na noite da premiação e foi muito emocionante e ali eu disse 'não tem como eu não falar sobre isso no meu trabalho'. Eu fui meio que desafiada, convidada a esse tema de olhar pro Nordeste, trazer o Nordeste pra cá, desconstruindo um pouco dos esteriótipos, da imagem que as pessoas tem de uma estética da fome, da seca, da pobreza, da dificuldade. O Nordeste é muito mais que isso, mas muita gente não tem noção. Pensei: posso fazer um disco que abra espaço pra falar sobre isso, que não resolva nenhuma questão, mas que dentro do disco você pense sobre isso, lembre dessa questão, pense que o Nordeste é um pouco além do que você imaginava.", conta Juliana.
O disco contou com participações muito especiais, como a do cantor e compositor paraíbano, Chico César. "Criei coragem de escrever pro Chico dizendo 'Topa compor comigo?' e ele topou.". Um mês depois, Juliana enviou a primeira letra e em uma hora e meia, Chico finalizou "Embrulho". Durante toda essa troca, o paraibano disse à Juliana "Ju, a alegria é revolucionária. O sistema todo faz com que a gente perca a alegria. Tudo o que se quer, é que a gente adoeça. Então, o que a gente precisa dar é alegria mesmo, que é saúde". Essa conversa inspirou a artista a compor "Lambada Lambida", faixa que retrata um amor entre mulheres.
"Aburguesar" foi composição de Tom Zé e é interpretada por Juliana e Letrux. Nos anos 70, Tom Zé escreveu essa canção, mas decidiu não gravar, e através de Marcus Preto, diretor artístico do disco, surgiu a possibilidade dessa gravação. "Eu ouvi a música e achei incrível, escrevi pro Tom Zé, ele e a mulher dele me responderam, foram muito queridos, são demais!". Sobre a participação de Letrux, Juliana conta: "Eu amo a Letícia, sou muito fã há muito tempo. Acho ela muito forte no palco. Ela traz essa identidade, traz um elemento, faz uma festa. Quando a gente pegou a música, eu pensei: Quero uma mulher e um cruzamento com o Rio de Janeiro, porque meu Nordeste Ficção fala sobre isso. Não é só o Nordeste, é a fronteira... Vamos diluir, né? E aí a gente pensou 'pô, a Letícia vai fazer super bem esse negócio.' E aí ela topou. A gente já teve algumas trocas várias vezes, em várias situações, então super rolou."
Zeca Baleiro foi parceria do primeiro single do álbum, "Meu Amor Afinal de Contas". O cantor já conhecia o trabalho de Juliana, o que foi uma surpresa para a potíguar. "Fiquei muito emocionada, não imaginava que ele já me conhecesse. Ele topou compor comigo, aí eu mandei a letra e quando ele mandou a música, eu chorei muito também. Foi aquela voz que me influenciou a vida inteira cantando uma música comigo." Mestrinho foi convidado para gravar a sanfona na música "Balanceiro". Para Juliana, "Foi muito emocionante, chorei a música toda."
A afinidade da cantora com os palcos do teatro e seu trabalho como diretora, influenciou bastante na criação do disco. "Meu trabalho de direção e de atriz, faz com que eu queria que tudo se ligue, que tudo tenha dramaturgia, que você consiga passear pelo tema... Então o trabalho do teatro, da direção principalmente, me faz querer olhar pro disco com o olhar de quem constrói uma narrativa e não só quem joga um disco no mundo. Eu sou muito do palco, infelizmente agora tá sofrido, mas quando eu for pro palco com esse disco... Aí minha filha, é show com tudo que tem direito."
Sobre como espera que o público receba o disco, Linhares diz: "A minha expectativa é só de ser ouvida. Queria que o disco fosse ouvido, que as pessoas ouçam. Espero que traga além de alegria, emoção. Queria que o disco abrisse um pouco a discussão do Nordeste com outro olhar, mas também que trouxesse um respiro de saúde mesmo." E ao escutar o álbum, Juliana pede: "Primeiro, pra ouvir de fone! (risos) Porque faz muita diferença e a gente faz um trabalho muito minucioso na mix, na master e é uma outra viagem. Bota um fone pra ouvir e ouve respirando, ouve mesmo, inteiro! Bebendo, dançando, com alguém. Só peço um momento, uma paz pra ouvir."
O Nordeste Ficção já está disponível em todas as plataformas de streaming e a cantora revelou que em breve haverá uma live de lançamento e estreará o clipe de "Bombinha", primeira faixa do disco.
Escrito por: Laura Araújo
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